quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Crônica Marsicana

Hilário relato de Alberto Marsicano sobre a ida dele com Roberto Piva, Claudio Willer e Roberto Bicceli à cidade de São Luís do Paraitinga:

 
A palavra selvagem
Sou convidado pelo poeta Roberto Piva a participar do Encontro de Arte Alternativa que ocorreria na tradicional cidade interiorana de São Luís do Paraitinga. Patrocinado por várias ONGs e grupos de rock locais, seria um evento paralelo às comemorações oficiais do aniversário da pacata cidade.
Num belíssimo domingo de sol e céu azul, chegamos com o escritor e ensaísta Cláudio Willer e o inspirado poeta Roberto Bicceli à sua simpática pracinha. Estávamos morrendo de fome e fomos calorosamente recebidos pelo produtor do evento, um baixinho de terninho verde que ostenta uma longa barba gnômica chamado Eugênio de Lima. Todo lampeiro mostrou-nos sua carteirinha da União Brasileira dos Escritores, recitando um de seus inspirados e geniais poemas de temática surreal.

(...)
 
Jeca Tatoo
A longa viagem abrira-nos o apetite e fomos logo conduzidos ao restaurante local, onde degustamos a excelente culinária interiorana com seu emblemático leitão à pururuca regado a fartos goles da soberba cachaça da região (lendária desde os tempos coloniais). Piva, profético como sempre, desatou a falar sem parar sobre xamanismo & poesia & surrealismo & beat generation e quando nos demos conta, já havia passado a hora da performance. Enquanto não aparecíamos, colocaram para tapar buraco o bizarro grupo punk sertanejo (country-punk) Menino da Podrera. Rumamos rápido à pracinha, onde poderosas caixas de som (dos metaleiros locais) já estavam preparadas para nossa leitura poética. Piva pega o microfone e inicia um de seus mais viscerais poemas:

  Eu sou a viagem de ácido
  Eu sou o garoto que se masturba
  Na montanha
  Eu sou o tecnopagão!
 
Tangia meu sitar acoplado a um reverber vintage de mola e uma câmara eco Ecoplex (de fita) e os acordes dilatados pontuavam as palavras proféticas de nosso querido Bardo. O técnico de som, um cabeludo heavy metal, guitarrista do grupo hardcore local Jeca Tatoo, entusiasmado com o valor artístico do espetáculo, aproveitou para aumentar ainda mais o volume. Piva, inspirado, continuava:

  eu sou o cavalo de Exu
  ebó
  do meu coração
  despachado
  nas encruzilhadas dos cometas!
 
Nesse instante, noutro lado da praça, surge inesperadamente uma grande procissão tendo à frente a imagem da padroeira da cidade. Centenas de fiéis, liderados pelo prefeito, o bispo, o delegado e autoridades locais, revoltados com a poética incômoda de Piva, partiram em nossa direção, iniciando um violento bate-boca que acabou em pancadaria generalizada. Enquanto Willer era ameaçado pelas costas, Bicelli rechaçava no muque os fiéis. Tivemos de sair correndo de lá, e vendo meus honorários indo por água abaixo, perguntei sobre o pagamento ao gnômico baixinho, que, esquivo, olhando-me de esguelha e saindo à tibetana, entregou-me seu cartão de visita em que se lia:
 
Eugênio de Lima

Modelo Fotográfico
da Revista Casa e Jardim
 
*Do livro Crônicas Marsicanas, de Alberto Marsicano.

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1 Comentários:

Blogger Felicidade Clandestina disse...

Wilson,
obrigada pela adorável visita! : ) abração!

8 de setembro de 2013 às 13:10  

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